sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Duas Bolas, Por Favor

 

Não há nada que me deixe mais frustrada do que pedir sorvete de sobremesa, contar os minutos até ele chegar e aí ver o garçom colocar na minha frente uma bolinha minúscula do meu sorvete preferido. Uma só.
Quanto mais sofisticado o restaurante, menor a porção da sobremesa.
Aí a vontade que dá é de passar numa loja de conveniência, comprar um litro de sorvete bem cremoso e saborear em casa com direito a repetir quantas vezes a gente quiser, sem pensar em calorias, boas maneiras ou moderação.
O sorvete é só um exemplo do que tem sido nosso cotidiano.
A vida anda cheia de meias porções, de prazeres meia-boca, de aventuras pela metade.
A gente sai pra jantar, mas come pouco.
Vai à festa de casamento, mas resiste aos bombons.
Conquista a chamada liberdade sexual, mas tem que fingir que é difícil (a imensa maioria das mulheres continua com pavor de ser rotulada de 'fácil').
Adora tomar um banho demorado, mas se contém pra não desperdiçar os recursos do planeta.
Quer beijar aquele cara 20 anos mais novo, mas tem medo de fazer papel ridículo.
Tem vontade de ficar em casa vendo um DVD, esparramada no sofá, mas se obriga a ir malhar. E por aí vai.
Tantos deveres, tanta preocupação em 'acertar',tanto empenho em passar na vida sem pegar recuperação...
Aí a vida vai ficando sem tempero, politicamente correta e existencialmente sem-graça, enquanto a gente vai ficando melancolicamente sem tesão...
Às vezes dá vontade de fazer tudo 'errado'. Deixar de lado a régua, o compasso, a bússola, a balança e os 10 mandamentos. Ser ridícula, inadequada, incoerente e não estar nem aí pro que dizem e o que pensam a nosso respeito. Recusar prazeres incompletos e meias porções.
Até Santo Agostinho, que foi santo, uma vez se rebelou e disse uma frase mais ou menos assim: 'Deus, dai-me continência e castidade, mas não agora'...
Nós, que não aspiramos à santidade e estamos aqui de passagem, podemos (devemos?) desejar várias bolas de sorvete, bombons de muitos sabores, vários beijos bem dados, a água batendo sem pressa no corpo, o coração saciado.
Um dia a gente cria juízo. Um dia. Não tem que ser agora.
Por isso, garçom, por favor, me traga: cinco bolas de sorvete de chocolate, um sofá pra eu ver 10 episódios do 'Law and Order', uma caixa de trufas bem macias e o Richard Gere, nu, embrulhado pra presente. OK?
Não necessariamente nessa ordem. Depois a gente vê como é que faz pra consertar o estrago . . .

(Danuza Leão)

Silvia, minha amiga densa e intensa me confessou num máximo de tristeza – daquelas que nos acomete sem motivo algum quando tomamos cerveja demais - que antes de morrer quer fumar maconha e tomar chá de cogumelo.  “Preciso sair do meu corpo, sacar as espiritualidades inexplicáveis, rir a toa de tudo ou nada, tá foda de aguentar Zezinho, Luizinho, Huguinho.” 

Minhas insanidades e libertações são caretas. Acordo, alongo, pulo da cama, ligo o rádio e começo a dançar na sala; dizem que correr e caminhar faz bem, mas gosto mesmo é de dançar e acordar o mundo ouvindo Armandinho.  Nunca tomei Santo Daime ou chá de cogumelo – não gosto de perder o controle de mim mesma -  mas já fumei maconha, já bati altos papos com o senhor e senhora peixinhos de aquário. Também já pedi ajuda dos meninos para trocar pneu ou lâmpadas, já corri de baratas voadoras, andei descalça em trilhas na madruga da Ilha Grande, já coloquei copo na parede só para escutar o vizinho transando. Já transgredi, já regredi, já progredi, não pedi desculpas, muito menos perdão. Não sou dada a pedido de desculpas e muito menos perdões; sou dada a foda-ses educados e gentis e depois me acerto com o cara lá de cima no dia do meu julgamento. Adoro estar rodeada de gente inteligente, mas odeio papos comprometidos em inteligência  só para agradar e fazer parte do grupo – e é sempre bom interromper esses papos chatos com Chocolate, Caramelo e Biscoito.

Sei lá Silvia, gosto de brigar com minhas medidas pós viagens, de ter contas para pagar, compromissos para cumprir, de reclamar de minhas acelerações; mas estou sempre slow motion na próxima trip.  Ando meio em paz com meus anjos e demônios, sem medo dos meus medos e não procurando injustiça divina por não ter fechado os números da Tele Sena, da Mega Sena ou do Bingo.

Amiga! Quer saber? Se quiser fumar, fume. Se quiser beber, beba. Permita-se fazer o que você quiser. Dê uns pegas naquele office-boy gatissimo do seu escritório, dance um regguinho ao redor da fogueira, beba vinho do porto no gargalo; depois a gente sacia a sua larica dividindo potes de sorvete e colocando glicose na veia.  Acorde no dia seguinte e pergunte: que merda eu fiz ontem a noite?  Só não vá me cair de cara na bosta da vaca, pois se eu estiver por perto além de  rir muito vou contar para todo mundo que você estava procurando cogumelo e caiu de cara na bosta da vaca.

Hoje fiquei batendo papo com o pintor que está trabalhando aqui em casa. Conversávamos sobre essas “inconformações do estar vivo entre os vivos”. Entre um teste e outro nas cores em parede,  ele me contou a história de Naamã e os sete banhos em busca da cura. E mesmo com caminhos de fé diferentes, não foi  dificil comunharmos que mergulhar na sujeira faz bem ao espirito e, de alguma forma, ajuda a crescer, entender e nos libertar de nós mesmos, de nossos conceitos – ou não. De alguma forma, a sujeira ajudou a salvar uma vida.

Seja Flor de Lótus ou Lírio. Mas seja…

Ao final, é muito melhor discutir relação usando meias 7/8.

 

6 comentários:

Anônimo disse...

kkkkkkkkkkkkkk
he he he heh he
ha ha ha ha ha ha

Ler isto é um deleite para mim. Isto é um testemunho a mais do que fizeram ao
genero feminino... posso dizer com firmeza, com força plena que os ares nos pulmões permita:

- EU ESTOU CERTO!

Minha mulher continua sendo minha MULHER. he he he

Ontem cheguei em casa, e a encontrei suada do trabalho doméstico. Com oito reais que me sobrou do dia, passei na banca da baiana e comprei-lhe dois acarajés. Passei num bar e comprei-lhe duas cervejas em lata.

Sentei à mesa e fiquei-lhe observando comer e tomar a cerveja. Enquanto isto, ela deu de ombros quando cobrei-lhe o obvio.

- Você está atrasada meu amor! Nesta hora, já era para a casa estar arrumada, você ter tomado seu banho, e estar cheirosa no sofá esperando seu marido, que sou eu, cheio de desejo sexual.

Ela deu de ombros, e apenas exclamou:

- Humpph! Vai sonhando! Vai sonhando!

Ouça "Carne e Osso"

Vai ficar como anonimo!
Um cheiro carinhoso!

Ela disse...

Danuza foi mestre na análise das coisas boas que podemos experimentar sem dó e piedade.
Adoro textos como os teus que quando leio vou me identificando a cada linha.

E sempre muito bom fugir da rotina e vir aqui um cadinho

Edimar Suely disse...

Olá,

O espaço Jesus Minha Rocha completou 4 anos de existência e 85.000 visitas e você faz parte dessa história. Vem comemorar comigo e traga seu mimo.

Te espero por lá.

Smack!

Edimar Suely
jesusminharocha2.zip.net

Telma disse...

Oi Beth, uma bola de sorvete é muito pouco! rsrs, esses restaurantes chiques gostam mesmo de nos apresentar a sobremesa desse jeito, o melhor mesmo é comprar o nosso litro de sorvete e ir comer em casa, sentada no sofá com direito a repetição quantas vezes se quiser, rsrs. Um óptimo final de semana para ti. Beijinhos

Chilipoker disse...

Ola'!
gostei de ler seu post! A frustraçao é bem transmitida... uma bola de sorbeto é que nao, mesmo! Dificil de escolher quando as propostas sao muitas (liberdade?), mas quando se escolhe e nao se obtém? Os riscos a correr hoje em dia sao poucos e havia um cantor italiano que dizia "dai diamanti non nasce niente, dal letame nascono i fior"... Flor de lotus ou lirio... mas antes é preciso passar pelo nojo.
Paraéns pelo blog (faz pensar, mas com leveza)

Nati disse...

Bethinha,
Depois de ler esse texto, irei comer potes de sorvete Napolitano sem culpas. Você e Danuza foram ótimas.