sábado, 10 de maio de 2008

A questão é tão somente dignidade humana

 

Amanhã é Dia das Mães, um data comercial, mas comemorada por àquelas que têm, tiveram, ou pretendem ter o exercício da maternidade. Uma data festiva para muitas familias e sonhada por tantas outras.

No entanto, a Revista Época, justamente no Dia das Mães, traz a tona uma discussão sobre o aborto, e é enfática no que diz respeito a investigação criminal que está na mira de mais de 3 mil mulheres que praticaram aborto no Estado de Mato Grosso do Sul. Citando inclusive, o procedimento adotado em outros estados no que se refere a punibilidade.

A discussão é: que pena elas devem ter? Seria um retrocesso nas discussões ou uma forma de atenuar as penas de reclusão que são previstas na legislação?

Bem para quem não sabe, na nossa legislação, o aborto é crime previsto nos artigos 124 a 128 do Código Penal, com penas podendo chegar a 10 anos de reclusão nos casos onde o aborto é cometido sem o consentimento da gestante.

Art. 124 - Provocar aborto em sim mesma ou consentir que outro lho provoque

Art. 125 - Provocar aborto sem o consentimento da gestante

Art. 126 - Provocar aborto com o consentimento da gestante.

Art. 127 - As penas cominadas nos dois artigos anteriores são aumentada de um terço, se, em consequência do abordo ou dos meios empregados para provocá-lo, a gestante sofre lesão corporal de natureza grave; e são duplicadas, se, por qualquer dessas causas, lhe sobrevêm a morte.

Art. 128 - Não se pune o aborto praticado por médico:

I - Se não há outro meio de salvar a vida da gestante; (aborto necessário)

II - Se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representente legal (resultante de estupro)

Visto pelo prisma  de que o aborto é crime, há uma grande preocupação por parte das autoridades na forma como são praticados os abortos. Algumas clinicas chegam a aplicar remédios para cavalos nas pacientes. Outras, apenas orientam que em caso de hemorragia, a paciente deverá procurar um hospital público.  E em muitas, o preço cobrado chega a quase vinte mil reais. Isso sem falar dos remédios que se compram na ilegalidade e das ervas que são usadas em infusões tão somente com o intuito abortivo que muitas vezes não produzem o resultado esperado e acabam por ocasionar o óbito da mulher por causa da hemorragia.

A matéria, que somente chega nas bancas neste domingo, traz a discussão sobre a penalidade que essas mulheres estão tendo por parte do Tribunal de Justiça de Mato Grosso que está substituindo a reclusão prevista no Código Penal pela  pena alternativa de trabalhos comunitários. E tal decisão está sendo visto como constrangedor, haja vista, ser traumático uma mulher que praticou um aborto ainda ter que lidar com crianças em creches e escolas, que são determinadas pela Justiça.

Enquanto o Congresso ainda discute mudança na legislação no que se refere a discriminalização do aborto,  a camisinha e os meios contraceptivos normais são os melhores métodos para a prevenção a gravidez, e para não correr risco de vida na mão desses carniceiros que no fundo, só querem dinheiro sem se preocuparem com o bem estar da mulher. Hoje, segundo dados fornecidos pelo Ministério da Saúde,  cerca de 230 mil mulheres sofreram complicações durante o procedimento.

Nos casos previstos no art. 128 de nossa legislação penal, caberia a justiça e tão somente a justiça agilizar os pedidos que são provenientes de risco de vida e estupro.  Muitas mulheres são obrigadas a recorrem à essas clinicas clandestinas e, usarem métodos diversos tão somente por causa da demora judicial nas suas decisões. Assim como se busca mudanças na legislação no que se refere a agilidade dos julgamentos dos crimes de homicidio, também deveria haver uma agilidade nos processos de mulheres que ainda buscam aprovação da  justiça para que possam praticar o aborto nos casos de gravidez pós estupro, ou risco de vida.

E não é só a mudança na legislação que deve ser objetivada, mas deve haver um preparo médico e hospitalar caso o aborto seja permitido no país, bem como, uma acompanhamento psicológico dessa mulher, caso contrário, teremos a indústria da legalidade abortiva que  ao final, tão somente  beneficiará planos de saúde e algumas poucas beneficiárias. É bem provavel até que planos de saúde não cubram tal procedimento num futuro próximo, voltando assim a estaca zero no que se refere a assistencia médico/hospitalar.

Com essa postura do Tribunal de Mato Grosso do Sul abre-se um precedente para que outros tribunais tomem a mesma decisão. Mas uma nova discussão se visualiza no que se refere ao constrangimento que essas decisões também podem ocasionar.  O juiz Aluízio Pereira dos Santos afirma que a decisão foi proposital, para fazê-las refletir sobre a maternidade. “Se elas forem trabalhar em creches e escolas, vão ver que muitas mulheres podem criar um filho com um pouco de esforço”, diz. Decisão essa questionada: “Mandar mulheres que abortaram recentemente trabalhar com crianças é uma tortura moral e afetiva”, diz a antropóloga Debora Diniz, diretora do Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero, em Brasília, defensora da descriminalização do aborto.

Bem, pelo visto a discusão é muito mais séria do que "tão somente  ser direito da mulher" em decidir o melhor momento de interromper uma gravidez não desejada, pois nessa decisão envolve também  dignidade humana e nisso está implicito vida, saúde, familia; direito a médicos e assistência psicólogica. Não é só discriminalizar é mudar toda uma postura na saúde pública, saúde privada e judicial.

Fonte: Revista Época / Codigo Penal

Maio é o mês da mães, das noivas e 28 de Maio é o Dia Internacional de Ação pela Saúde das Mulheres. Campanha pelo Exercício dos Direitos Sexuais e dos Direitos Reprodutivos. Chamado à Ação de 2008

2 comentários:

Anônimo disse...

Dois casos:

1 - Quando voltei em Nanuque, em 1997, um amigo estava sendo processado pela namorada. Ela queria metade de tudo que ele tinha conquistado no período, e ele, iria perder, quando eu perguntei:

- Quem foi que terminou o namoro, voê ou ela?
- Foi eu!
- Porque?
- Porque ela ficou grávida, fez um aborto sem me avisar.
- E porque você não denuncia ela?

Ele levou o caso ao advogado, ela retirou a queixa contra ele.

2 - Certo dia, entrei no escritório e encontrei uma amiga chorando.
- O que foi?
- È que vivo atormentada com uma besteira que fiz quando tinha vinte anos.
- E o que foi?
- Fiz um aborto, porque o pai disse que não ia assumir. E até hoje, eu sinto vontade de bater em mim mesma, e choro amargurada por minha loucura e covardia.

Nestes dois casos, não passou por minha cabeça nenhum sentimento de compaixão por elas.

CDAD disse...

Esse assunto é motivo de brigas e discussões, apesar de ser advogada, e saber que o aborto é permitido em certos casos, ainda acho que a mulher (se não quer a gravidez) precisa tentar evitá-la de algum modo. Por outro lado, e justamente porque só as mulheres engravidam, o peso dessa responsabilidade caí somente sobre ela, e, nem sempre ela está preparada para isso... O tema é delicado.