quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Nas águas do saber de Cora Coralina

a Estava procurando um poema de Cora Coralina que ilustrasse um comentário que eu iria fazer no ultimo texto de Adão. Um poema que falasse do amor na velhice, da oportunidade que todos nós temos de recomeçarmos um dia-a-dia um pouco mais sã no bem estar, no amor para com outrem, no seu amor-próprio. Encontrei essa poesia sob uma percepção de Olympia Salete Rodrigues, no site Para Ler e Pensar. Não a ilustrei no texto do Adão, por ser óbvio, ela é enorme - escolhi uma outra. Mas trouxe-a por aqui, para homenagear meu lindo tio, que aos 70 anos, marcou seu casamento com seu novo amor de 65 anos. Já escrevi sobre ele por aqui e de sua frase que muito nos fez rir. "Viúvo é quem vai e não quem fica. O que mais teria que fazer aos 70 anos? Esperar a morte chegar? Não. Vou aproveitar muito e dar muito trabalho à morte em me encontrar."

Cora e meu tio tiveram casamentos desastrados e após o falecimento de seus companheiros, simplesmente, recomeçaram a viver. Quero ser assim...Igual Cora, igual meu tio, igual àqueles velhos que estão no baile dançando e rodopiando. Quero saber que posso sobreviver aos desastres de um amor, mas ainda sendo capaz de amar em um novo recomeço. Quero saber que serei velha, um dia. Sendo velha, quero saber que fui jovem, algum dia.

Sabeberem nas águas de Cora Coralina.

"Uso sempre a palavra velho (ou velha)... Não gosto, quem me lê já sabe, de idoso ou terceira idade... Ai, isso até me dói.... rs..., pela tentativa de falsidade que encerra. A palavra velho implica numa carga de sabedoria e experiência que nos dá a vida à medida em que vivemos. E dessa carga também quero falar.

Eu, pessoalmente, recebo uma série de observações que poderiam até parecer desagradáveis e indelicadas. Só que não as sinto assim porque as acolho com serenidade. Por falar eu de amor, e por amar de verdade, muita gente entende que sou atrevida, ridícula, inconseqüente etc. etc.... E, o estranho disso é que não ouço tais críticas de pessoas jovens, mas de pessoas que estão caminhando para o auge da maturidade cronológica e atribuem a mim os fantasmas da própria velhice que se aproxima. Os jovens, em geral, admiram minha coragem de amar e declarar meu amor. Para eles, quase sempre, a idade fica em segundo plano, não influi na relação ou no diálogo. Mais ainda, eles até se declaram egoístas, querendo aprender e sorver a sabedoria do velho com quem se relacionam como amores ou como amigos. Daí eu concluir que aqueles que tentam anular o direito de amar dos velhos, estão apenas refletindo neles seus próprios medos, sua incapacidade de amadurecer o amor na medida em que amadurecem em idade.

É simples encarar a equação. Ninguém, em seu perfeito juízo, negaria ao velho os direitos todos que a vida lhe dá: comer, dormir, divertir-se, trabalhar, enfim, exercer plena e conscientemente a vida que pulsa. Por que negar-lhes o direito ao amor e ao sexo? Se isso fosse normal, certamente esses desejos legítimos e saudáveis se arrefeceriam com o passar do tempo. Se não arrefecem é porque a natureza sábia reconhece sua validade. E, pelo que constatamos, a libido não tem mesmo idade... Ela pede e grita no velho como pedia e gritava no jovem que ele foi. E como aceitar uma restrição que venha de fora? Como ceder à pressão e se enclausurar, renunciar a viver esse lado exultante do eu?


Pensemos um pouco em nossos antepassados: pais, avós, familiares que se entregaram a um marasmo na velhice por não terem força para lutar contra preconceitos terríveis e tão propalados que eles próprios os assumiam. O homem era até mais prejudicado, pois vivia perseguido pela "fatalidade" da impotência "obrigatória" depois de certa idade. E a grande maioria ficava impotente mesmo, pelo poder da sugestão. Os progressos da medicina vieram em seu socorro e hoje o problema, se aparece, é contornável. As mulheres não eram estigmatizadas por essa terrível previsão, mas o eram pelos preconceitos e se fechavam em conchas a partir de certa idade, acreditavam que a menopausa as tornaria menos fêmeas e menos desejáveis. E está fechado o círculo: casais velhos, frustrados e infelizes, apenas sentados indefesos na sala de espera da morte. E assim vimos ou temos notícias de tantos entes queridos que definharam depois de nos darem a vida, a educação, a sua sabedoria, para que seguíssemos felizes os nossos caminhos. E eu pergunto: isso é justo?

Convoco os ainda jovens para que abram suas mentes e preparem seu futuro de velhos. Só assim chegarão à velhice com a dignidade e a sabedoria que torna os velhos realistas, felizes e seguros. Seus preconceitos de hoje, se existem, os tornarão certamente velhos amargos, vítimas de si mesmos, das crenças errôneas que acumularam e deixaram que se cristalizassem.

Convoco os velhos como eu, ou mais velhos que eu, para exercerem seus direitos, esclarecer aos jovens suas posições e mostrar-lhes as verdades que viveram e que os tornaram melhores. Entreguemos o amor ao ser amado, sem vergonha e sem medo, e vivamos esse amor intensa e completamente, na alma e no corpo. Se disserem que idade não é documento..., mostremos que é sim, documento importante porque repleto de experiência e de aprendizagens muitas vezes à custa de sofrimento. Somos todos lindos, independente de aparência física, porque é linda nossa alma e linda a nossa coragem de amar! Portanto, não nos enterremos antes da hora. Vivamos, vivamos! No momento certo, outros nos enterrarão, gratos pelas lições que lhes deixamos."

2 comentários:

Anônimo disse...

Aprendi mais uma!
Isso é uma maravilha no compartilhamento

Fernanda disse...

Velho, idoso, terceira-idade são apenas palavras, Beth! Há quem se sinta insultado se lhe chamar velho, dizem até: velhos são os trapos. A diferença está na forma como nós os tratamos, o que conta é a acção, não a palavra. Pelo menos para mim é assim.
Bjos